Propostas para o aperfeiçoamento na Lei Estadual de Incentivo à Cultura


Em fevereiro de 2013, quando ainda se discutia a última revisão da Lei Estadual de Incentivo à Cultura de Minas Gerais – com destaque para a redução da contrapartida obrigatória para o patrocinador -, publicamos aqui no Blog algumas propostas para o aperfeiçoamento do mecanismo.

Passados dois anos, a nova gestão da Secretaria Estadual já sinaliza com a necessidade de novas mudanças da Lei, diante do esgotamento em tempo recorde do teto da renúncia fiscal para este ano. Isso torna o momento propício para renovar o post, apresentando novas sugestões para contribuir com o debate.

Algumas propostas apresentadas pela Nexo em 2013 continuam válidas, enquanto outras são novas e fruto da reflexão sobre o funcionamento da Lei no período. Em comum, a vontade de contribuir para o fortalecimento deste importante mecanismo de financiamento da cultura mineira.

Nos últimos quatro anos, o incentivo à cultura em MG teve ampliação considerável de recursos, tendo aumentado em mais de R$20 milhões entre 2011 e 2014, ampliação equivalente a 34% do valor investido no primeiro ano da série.

Embora os recursos tenham sido ampliados de forma constante e significativa nos últimos anos, é consenso que a Lei necessita de aprimoramentos.

Dentre as principais críticas ao mecanismo, encontramos de forma recorrente o questionamento em relação à concentração do investimento nas mãos de poucas empresas. Neste quesito, após organizarmos os dados do investimento por grupo empresarial, identificamos que, em 2014, 83,7% dos recursos foram aplicados por 16 “Grandes Investidores”. Consideramos grandes investidores, todos os grupos empresariais que aplicaram mais de R$1 milhão em determinado ano. A série mostra que a realidade não foi muito diferente nos anos anteriores.

Pode-se perceber que o movimento de redução da contrapartida (20% para 5%, 3% ou 1%), embora tenha ampliado o interesse pela Lei, contribuiu ainda mais para a concentração do mecanismo, possibilidade que já prevíamos no post de 2013. Embora não tenhamos clareza sobre qual o nível de distribuição adequado, entendemos que quanto mais desconcentrado, melhor.  Também acreditamos na ideia de diferenciar grandes investidores de pequenos, além de empreendedores da capital e do interior do Estado.

Além disso, entendemos que há pontos de melhoria na sistemática de apresentação de projetos e nos critérios para aprovação por parte da Secretaria.

De forma a contribuir com o debate, apresentamos à seguir seis propostas de melhoria, sendo duas relacionadas à descontração do investimento e outras quatro sugestões relacionadas aos demais pontos que julgamos críticos.

1) Alteração das faixas de faturamento para definição dos limites de dedução de ICMS.

A legislação atual iguala na faixa de 3% de dedução do ICMS devido empresas com faturamento de R$ 30 milhões a gigantes nacionais com faturamento de bilhões. A proposta abaixo amplia as faixas de faturamento para aplicação dos limites de dedução, fazendo com que pequenas e médias empresas tornem-se investidores mais relevantes.

2) Revisão dos percentuais de Contrapartida por porte do patrocinador

O percentual de contrapartida obrigatória do patrocinador deve respeitar o porte das empresas, criando melhores condições para a participação dos investidores de menor porte e ampliando a participação com capital próprio das grandes empresas.

Para tanto, já consideramos as novas faixas de faturamento propostas acima.

A forma proposta recupera a participação das empresas de grande porte no financiamento da cultura sem penalizar as pequenas e médias, favorecendo a desconcentração do poder de investimento.

3) Contrapartida exclusivamente em dinheiro e para o Fundo Estadual de Cultura

A primeira parte da mudança já foi implementada ao final da Gestão passada e deve ser mantida, pois extingue as contrapartidas em bens e serviços, difíceis de mensurar e que na maior parte dos casos traziam poucos benefícios aos projetos.

Propomos, no entanto, uma inovação na destinação dos recursos da contrapartida: ao invés de transferir esses recursos diretamente para os projetos, esse valor seria transferido para o Fundo Estadual de Cultura.

Muito se discute a necessidade de ampliação desse mecanismo, que fortaleceria a política pública para a Cultura e privilegiaria projetos independentes e com maior dificuldade para captação junto às empresas. Isso ajudaria a resolver um problema crônico de falta de recursos orçamentários para o Fundo, que não chegam a R$ 500 mil em 2015.

A transferência de recursos para o Fundo Estadual já é uma realidade no mecanismo estadual de incentivo ao Esporte em Minas e garante a aplicação de recursos em projetos que não têm capacidade de articulação de patrocínios no mercado. O modelo também é proposto na revisão da Lei Rouanet e serve para diversificar as fontes para fomento de projetos culturais em MG.

 

4) Isenção da contrapartida para projetos “do interior para o interior”

A prioridade de investimento no interior, muito defendida tanto pela Secretaria de Cultura quanto por parte do setor cultural mineiro, precisa ganhar incentivos objetivos. É importante garantir que os produtores tenham acesso mais fácil a recursos e que possam circular com suas produções.

Neste ponto, estamos cientes que qualquer recorte objetivo poderá gerar distorções, mas entendemos que a prioridade deveria ser dada a organizações sediadas no interior e para projetos realizados no interior (ou seja, o acúmulo dessas duas condições), para evitar que um simples comprovante de endereço da terra natal garanta a diferenciação para produtores sediados em Belo Horizonte.

5) Limite no valor de projetos para pessoas físicas

Este item sugere a imposição de limites de aprovação menores para projetos apresentados por pessoas físicas. Existe um movimento crescente de exigir das organizações que recebem recursos públicos mais transparência e demonstração de capacidade de gestão, como por exemplo o Novo Marco Regulatório do Terceiro Setor.

Nesse contexto, acreditamos que o indivíduo é o menor grau de organização possível e que este não deve ser igualado a organizações (empresariais ou sem fins lucrativos) que utilizam os mecanismos de fomento.

A restrição do valor de projetos evitaria que pessoas físicas fossem contemplados com valores que hoje se aproximam de R$1 milhão em um só ano e também facilitaria o cumprimento da regra que impede a apresentação de mais de dois projetos por pessoas ligadas a um mesmo núcleo profissional.

Nossa sugestão é que o limite para projetos apresentados por Pessoas Físicas não supere 25% do limite convencional de cada área para organizações.

6) Fluxo contínuo para apresentação de projetos

Anualmente, sempre na mesma época do ano, centenas de produtores, artistas e gestores culturais se mobilizam para apresentar os seus projetos à Secretaria. Depois da data marcada, novas propostas só podem receber chancela no ano seguinte.

Nesse sentido, vemos um entrave para que novos projetos sejam viabilizados, ainda que com possibilidade de captação, entre um ano e outro e um acúmulo de demanda para a Secretaria numa única época do ano. Soma-se a isso o fato que a maior parte dos projetos aprovados não são captados e precisam ser reapresentados e reavaliados anualmente.

Geramos assim um rotina pouco eficiente que suga energia tanto de produtores como da Secretaria Estadual. Daí a pergunta: porque não estabelecer fluxo contínuo para apresentação de projetos com prazo para análise pela Secretaria de Cultura? O modelo já funciona na Lei Rouanet e poderia ser adaptado à realidade estadual, trazendo mais flexibilidade para o setor e a otimização do esforço da Secretaria.

Acreditamos que as propostas aqui apresentadas não cobrem tudo o que pode ser aperfeiçoado e que certamente haverá pontos de divergência que devem ser debatidos, inclusive nesse espaço do blog da Nexo.

Entendemos ainda que o movimento que se observa com o esgotamento do teto em tempo recorde é sinal da ampliação do interesse pelo mecanismo, o que exige uma mobilização do setor em prol da ampliação do teto da renúncia junto à Secretaria de Fazenda – atualmente limitado à 0,3% da receita líquida do ICMS no ano anterior.